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BC3 - Base de Conhecimentos do 3º Juizado Especial de Maringá


impenhorabilidade, rejeita alegação, poupança usada como conta corrente

importado da bc4:

Como se verifica dos extratos de seq. xxx, apesar de os valores bloqueados serem oriundos de conta poupança do executado, tal conta era utilizada como conta corrente, como se vê da multiplicidade de levantamentos e depósitos. E essa forma de utilização da conta poupança se caracteriza abuso de direito: é uma tentativa de camuflar recursos penhoráveis, isto é, os recursos ordinários do capital de giro, utilizados para o pagamento das despesas correntes da pessoa, sob o rótulo de verba impenhorável, como poupança. Isso é uma tentativa dolosa de burlar a finalidade da norma protetiva, para estender ao capital de giro uma proteção de impenhorabilidade que a lei não lhe atribuiu.

Os valores que são separados em poupança são capital de reserva, para momentos de necessidade ou urgência, servindo à finalidade de eventual manutenção do executado em caso de inexistência de outros proventos ou rendas. São, até o valor indicado no art. 833, X, do NCPC, uma reserva mínima, suficiente para garantir o sustento do executado em períodos de maior necessidade. Sua taxa de risco deve ser mínima porque privilegia a segurança, sendo essencial a existência de uma reserva caso outras rendas venham a faltar, ficando depositadas para evitar a perda do poder de compra.

Esse é o valor protegido pela norma que prescreve a impenhorabilidade: a manutenção da dignidade do executado, por meio da proteção de suas reservas financeiras mínimas.

Já um valor deixado em conta corrente, não oriundo de salário, tem caráter de capital de giro. Ou seja, valores que não estão reservados, mas preparados para serem utilizados a qualquer momento, em qualquer tipo de investimento ou despesa. Valores indiscriminados, sem uma utilização específica, ou caráter de reserva, de manutenção, de subsidiariedade, de essencialidade. Em outras palavras, é o dinheiro utilizado para a movimentação da vida financeira do executado, seja pessoa jurídica ou física.

A movimentação financeira pode, inclusive, dentre outras possibilidades, tratar de investimentos, garantidos ou temerosos, arriscados ou seguros. A esses valores, a lei não estendeu proteção, porque realizou uma interpretação apriorística das intenções do correntista: escolheu o risco à segurança, podendo tais valores ser objeto de penhora.

Já o executado buscou uma terceira opção, que configura claro abuso da proteção da impenhorabilidade: tratou de colocar seus recursos de capital de giro numa conta que só é poupança no nome, porque é utilizada da mesma forma como utiliza sua conta corrente. Nela, o executado depositou valores, valendo-se de uma interpretação excessivamente literal da lei, e passou a realizar saques e depósitos constantes, demonstrando que não depositou ali valores para eventual utilização futura, mas para utilização corriqueira e imediata. Ou seja, buscou estender a proteção do art. 833, X, do NCPC para valores que claramente utilizava de forma atual e indiscriminada. Abusou, portanto, do direito à impenhorabilidade de valores depositados em poupança até o limite de 40 salários mínimos. A proteção da norma deve ser aplicada aos casos em que ela quis contemplar. E a interpretação da norma não pode ser puramente literal, sob pena de o resultado contrariar sua finalidade e intenção, e permitir que os mais espertos se beneficiem da própria torpeza.

A intenção da norma com a impenhorabilidade é proteger apenas as reservar financeiras que o cidadão conseguiu separar de seu capital de giro, dos seus recursos de uso diário, para guardar como um seguro para futuras intempéries, ou para investimentos.

O dinheiro de uso do dia a dia, de pagar contas, o capital de giro, que não é materialmente “poupança”, que não é reserva para o futuro, que não tem a natureza de poupança, e pois, não está abrangido pela intenção da norma, ainda que nominalmente fique escondido numa conta batizada de poupança. O que interessa, em suma, para definir se a verba é ou não penhorável, não é o rótulo da conta onde está: é sua natureza real, material, que é definida pela sua finalidade, e esta é demonstrada pelo modo como o dono do dinheiro o trata. Dinheiro que é tratado como capital de giro, é capital de giro, e é penhorável.

Isso posto, indefiro o pedido de desbloqueio formulado pelo executado.

Int.-se.


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versão 1.53 (28/5/2021 13:55)